No ar na novela das 18h da Globo, Ana Flávia Cavalcanti fala sobre personagens repletas de significados que interpreta em “Garota do momento”, no filme “Baby”, na peça “Conforto” e no manifesto “A babá quer passear”
Com 15 anos de carreira, Ana Flávia Cavalcanti está em um momento ímpar. No ar na novela Garota do momento, como Marlene, a atriz retorna às novelas, com um papel fixo, após cinco anos, em uma trama com a qual se identifica: a de uma mulher negra que é batalhadora, criativa, mãe solo e às voltas com o retorno de Érico (Silvero Pereira), pai de seu filho Carlito (Caio Cabral), revelando-se um transformista. Bissexual e envolvida com a causa queer, ela ainda colhe os louros do sucesso do filme Baby, de Marcelo Caetano, em que vive Priscila, que vive um relacionamento com outra mulher e também é mãe solo de um adolescente, fruto do romance com um homem gay.

“A trama da nossa família me diz muito respeito enquanto uma mulher bissexual que convive com muitas pessoas queers. Falar sobre respeito às escolhas individuais é um privilégio. E ver a transformação da Marlene também é algo muito poderoso e que pode refletir, e tomara que sim, na nossa sociedade. No caso de Marlene, Carlito e Érico, o que importa é o amor que essa família pode construir a partir das presenças sempre respeitando quem se é de verdade”, afirma Ana Flávia.
Marlene é uma personagem repleta de conflitos. De acordo com a intérprete, ela tem uma história de saída muito parecida com diversas mulheres brasileiras. “Ela é mãe solo e sustenta seu filho sozinha trabalhando com seus sabonetes, e quer mais. Ela se apaixona inicialmente por um homem casado (Fábio Assunção) e acaba se machucando nessa história, mas sua paixão pela profissão vai levá-la a superar essa decepção. São temas que, de fato, geram discussões e que podem levar a um aprofundamento entre nós. Sabemos que a novela é muito popular, chega em milhões de lares ao mesmo tempo e, muitas vezes, amplia o discurso”, observa.
“As novelas são muito assistidas. O povo fala das cenas, dos conflitos, comentam na praia, no ônibus, na faculdade e assim o assunto se propaga e a gente consegue passar a mensagem que importa”, completa.
Mãe solo
Em Baby, Priscila é casada com Jana (Bruna Linzmeyer) e tem um filho com Ronaldo (Ricardo Teodoro), que é michê. “Baby é um dos filmes mais lindos e importantes que eu fiz até hoje. Me representa muito, me ensina muito e me faz ter orgulho do nosso cinema. Somos inventivos, corajosos, divertidos, e isso se vê em nossa cinematografia. O filme estreou em Cannes e fomos premiados com o Melhor Ator para Ricardo Teodoro. O filme gera muito debate e as pessoas terminam arrebatadas. Depois, Baby já passou quase no mundo todo e teve sua estreia no Brasil no Festival do Rio, onde saiu premiado como Melhor Filme”, comemora.

Com ou sem Oscar vindo na semana que vem para Ainda estou aqui e Fernanda Torrres, Ana Flávia acredita que o cinema brasileiro iniciará uma nova fase, com maiores incentivos. “A sensação que temos é essa, sim. Semana passada, a SPcine fez um comunicado dizendo que já recebeu mais pedidos de produções cinematográficas querendo filmar em São Paulo, e que já está aprovado um aporte maior para novas produções. Nossa cinema já é muito considerado em todos os festivais importantes do mundo. Tivemos uma hiato, mas estamos de volta com força total, estamos definitivamente aqui”, exalta.
Ana Flávia também celebra estar em cena com sua mãe, Val, ex-empregada doméstica que estreia como atriz aos 68 anos, na peça Conforto, em que assina a dramaturgia e a direção. “É o significado de boa sorte e novos tempos. Eu vivi pouco com minha mãe, que também era solo, nos vimos pouco, ela sempre trabalhando muito e, depois eu saí cedo de casa, então, esse nosso reencontro nos palcos muito me alegra. Ela me ensina demais dentro e fora do teatro.”
Em outro projeto em que honra a jornada da mãe e a dela própria, que também trabalhou como diarista e babá antes da fama, Ana Flávia criou o manifesto A babá quer passear. No projeto artístico, que já esteve em diversos lugares do Brasil e do mundo, uma babá dentro de um carrinho de bebê gigante e cor-de-rosa discute a invisibilidade das trabalhadoras domésticas no Brasil. A performance será apresentada, em março, em Poços de Caldas (MG). “A babá segue passeando sim, uma vez que você conhece o passeio não quer parar nunca mais”, conclui.