Esse texto é continuação do texto Cotas de Tela e a Formação de Industria Parte 1. É imprescindível que você procure aqui na revista DBN a primeira parte para acompanhar esse! Bem, vamos lá então!
ENTENDENDO OS TAIS MOVIMENTOS: OS REALIZADORES
Os realizadores, são principais entusiastas da cota de tela. Como todo movimento ideologizado, acabam por gritar metade das verdades enquanto omitem a metade mentira. A verdade que apontam é que para que haja um desenvolvimento da indústria audiovisual, as cotas acabariam por elevar o patamar de filmes produzidos ao ano, afim de suprir a demanda que agora tem uma reserva de mercado garantida. Isso faria com que, progressivamente, mais pessoas buscassem estudar, praticar e se lançar na profissão audiovisual, gerando mais concorrência, melhorando tanto a qualidade dos profissionais quanto dos filmes por concorrência. Haveria a criação de um círculo virtuoso em que melhores profissionais estariam fazendo melhores filmes, e melhores filmes estariam atraindo mais profissionais e investidores para o Audiovisual. Só que há detalhes importantes aí.
Para que esse desenvolvimento de profissionais audiovisuais ocorra a ponto de aumentar a qualidade dos filmes e vice-versa, é necessário que esses filmes sejam CONSUMIDOS. Se falhar, isso se torna um ponto de inflexão que vai tomar o rumo contrário: um círculo vicioso em que o investimento se prova, anualmente, que não vale a pena investir em filmes brasileiros. Com isso, o lobby pela derrubada de cotas de tela crescerá, e dessa vez com razão. Ninguém gosta de fracasso, especialmente quem paga por ele. Que fique claro, realizadores não pagam pelos seus filmes, eles são pagos para fazê-los. Quem paga é o Estado e o investidor privado que costuma ser os exibidores. Quando a Petrobrás ou a Vale pagam o filme, ainda assim é o Estado que está pagando, pois grande parte é deduzido da arrecadação de impostos.
Os realizadores ainda alegam que os filmes hollywoodianos inundam o mercado brasileiro com estereótipos e comportamentos culturais que não se aplicam aqui, provocando distúrbios nos próprios hábitos de consumo. Isso caracterizaria um domínio cultural que impediria a diversidade e favoreceria a massificação cultural. Com o passar dos anos, o treinamento sensorial e a sensibilização ordinária do povo estariam condicionadas a somente ver valor nas fórmulas hollywoodianas.
Há boas doses de verdade aí, mas se durante muito tempo as pessoas não consomem o audiovisual brasileiro com a mesma frequência que o material estrangeiro, ou esses realizadores não estão acertando a mão, ou de fato o problema do brasileiro com sua autoimagem é mais profunda do que se pode manejar.
De qualquer forma, é mais fácil fazer a revolução audiovisual já em posse de uma indústria, com profissionais qualificados, know-how e dinheiro massivo, do que em meio à miséria atual de recursos e de profissionais. A miséria não ensina nada, não provê condições de nada. Filmes que fracassam em bilheteria não desenvolvem nada, apenas mostram como não fazer… sendo que há sim produtores que tem filmes lançados como fracassos, e que continuam recebendo dinheiro de editais para fazer outros filmes porque “o cinema precisa de diversidade”. A tal diversidade por vezes usa de representação como fim, quando deveria ser um meio, e acaba rezando missa pra convertido ao fazer filmes para seus amigos. De forma dura: representatividade é uma forma de diversificar quem vai lucrar e como vai lucrar. Quais imagens e histórias serão adoradas. Quando só se tem homem branco sendo adorado e gerando lucro, o problema está na exclusividade. Quando a adoração vira um totem religioso que consome recursos ao invés de angariar, isso é a outra ponta do problema. As histórias, imagens e paradigmas pretos são capazes de lucrar também, e é isso que eu defendo e cobro. Oportunidade. A curto prazo, a economia condiciona a Cultura. É a longo prazo que a premissa se inverte: no prazo histórico a Cultura condiciona a política, que por sua vez, condiciona a economia.
O problema do realizador ao meu ver, é que ele acha que o seu trabalho termina quando recebe o pix do pagamento na produção do filme. Não, o filme dele tem que performar! Pra performar, ele precisa parar de militar, chorar espaço e fazer mais coisas conectadas com o povo. Precisa olhar para as formulas milenares de Storytelling e parar de desejar uma liberdade que nunca existiu em lugar nenhum senão na própria fantasia. Quer fantasia? Ficcionaliza ela com as técnicas certas e metaforiza isso em terror, em ficção científica, em ação. Só que isso é difícil demais, os atuais realizadores preferem se arriscar menos com dramas realistas de crítica social e/ou documentários. Deixa eu falar uma coisa pra todos nós: O brasileiro não gosta dessas coisas. As vezes eu acho que não temos realizadores com competência para escrever, dirigir e produzir filmes assim. Será? Posso ser convencido de que existem, mas não posso ser convencido de que os realizadores atuais são corajosos. A proporção de dramas e documentários que ninguém assiste é que me prova isso.
Pra finalizar vou deixar pra reflexão, alguns dados de quantidade de filmes em indústrias cinematográficas ao redor do mundo:
Hollywood (Estados Unidos): Cerca de 600 a 700 filmes por ano.
Bollywood (Índia): Entre 1.500 a 2.000 filmes por ano.
Nollywood (Nigéria): Cerca de 2.000 a 3.000 filmes por ano.
Indústria sul-coreana: Aproximadamente 300 a 400 filmes por ano.
Indústria cinematográfica chinesa: Cerca de 800 a 900 filmes
Indústria Argentina: 100 a 150 filmes por ano. Embora número baixo anual, a proporção de filmes bons e populares é uma das maiores do mundo, o que justifica ser citado aqui.
Brasil: Aproximadamente 120 filmes por ano. Nem 10 obtém mais de 50 mil espectadores.