Muito prazer, eu sou Carol Montelo, estilista e designer de moda e estou aqui pra te ajudar com essas dúvidas!
Hoje vamos de papo polêmico, sincero e reflexivo sobre um assunto que tem me gerado muito incomodo. Tenho visto, de forma massiva, muitas influencers de moda julgando sobre itens do vestuário feminino e separando entre os elegantes, os bregas, os cafonas, os que te deixam com cara de rica e aqueles, que nas palavras delas “empobrecem o visual”. Outras levantando polêmicas sobre as roupas de poliéster que por ser uma fibra sintética derivada do petróleo, não possui a mesma qualidade da fibra natural, logo não deixam sua imagem com cara de rica. Já outras trazendo afirmações do tipo: “Usar calça jeans é cafona e passa uma imagem de pessoa desleixada.” ou “usar chinelo é brega…”. Afirmações depreciativas como essas circulam a respeito de vários itens do guarda roupa feminino, entre acessórios e até mesmo sobre decoração de unhas e maquiagens.

Fico me perguntando: onde foi que erramos como seres humanos pra chegar a tal ponto? Claramente, pessoas com poder aquisitivo alto, que nunca se dedicaram a estudar moda a fundo, criticando artigos como o jeans ou o blazer de poliéster da loja de departamento, ou então o estilo maximalista de algumas culturas que utilizam estampas e acessórios para se comunicar, sem nunca sequer, questionarem a origem desses artigos ou estudarem sobre a história desses itens tão populares e democráticos na moda e nas diversas culturas.
Precisamos relembrar que o conceito de elegância já se fez e refez diversas vezes ao longo da história e são diferentes do ponto de vista entre as culturas. Exemplificando a diversidade, para algumas culturas de matriz africana, a elegância é pautada pelo maximalismo de peças robustas, volumosas e estampadas. Alguns séculos atrás, a elegância se baseava na silhueta desenhada por espartilhos, luvas e chapéus enormes e excêntricos.
No cenário atual, a elegância está sendo definida por roupas em tons claros e neutros, nada muito chamativo e em acessórios minimalistas.

Na minha opinião, elegância é um termo muito subjetivo e pessoal e está mais atrelada a comportamento do que vestimenta. Ela pode estar presente em uma pessoa, usando calça jeans e camiseta, e ainda assim, ser algo claramente perceptível em seu comportamento. Estão confundindo elegância com poder aquisitivo, fazendo associação do termo com peças de alto valor monetário. Não podemos aceitar essa associação pois nem sempre os artigos de maior valor irão trazer essa qualidade para sua imagem e raramente são acessíveis à população mais hipossuficiente. Isso significa excluir a ideia de elegância de diversas culturas espalhadas pelo mundo a fora, ou que uma pessoa de baixa renda que utilizou boa parte do seu salário para comprar um blazer na loja de departamento possa ser considerada elegante. Por outro lado, é muito fácil julgar a roupa do outro e por suas próprias conclusões, baseadas no próprio modo de vida, que certamente é de alto padrão, afirmar com convicção que aquele look não possui elegância ou a qualidade que precisa ter para ser considerado de tal maneira requintado, fino e “elegante”.

Precisamos lembrar que o papel dos influenciadores traz uma responsabilidade crucial pro comportamento feminino, quando se trata de moda, beleza e cultura. Essas pessoas tem em mãos ferramentas capazes de alcançar as mais vulneráveis camadas da sociedade e de influenciar o poder de comportamento e de compra do seu público, então se dizem que usar calça jeans ou estampas coloridas, ou o cabelo volumoso é sinônimo de desleixo, o público vai acreditar e correr desesperadamente para a loja de departamento mais próxima ou fazer uma dívida muito alta para pagar aquele conjunto de terninho de grife. Isso leva muitas pessoas a se colocarem em situações de vulnerabilidade econômica, contraindo dívidas, acreditando que estão fazendo o correto para alcançarem a tal “elegância” que a influencer citou em suas redes sociais e se sentirem pertencentes a um grupo.

O cenário pode ser pior, quando percebemos que estamos falando também da autoestima de milhares de mulheres que buscam inspirações nas redes sociais e que já chegam nas plataformas com sua autoestima frágil depois de sofrerem enormes pressões estéticas para se encaixarem em padrões de beleza inalcançáveis. Especialmente, quando o assunto é a autoestima da mulher negra, precisamos lembrar que são séculos de opressão e ditadura do padrão de beleza europeu.
Crianças pretas ainda crescem sendo ensinadas que o cabelo liso é mais bonito que o crespo e infelizmente são submetidas a alisamentos que irão prejudicar não só o cabelo, mas principalmente sua autoestima no futuro. Então, se uma influenciadora posta em suas redes sociais afirmando aquilo que é elegante e o que não é, vemos mais uma vez a repetição de padrões de comportamento que ditam moda e tendências em detrimento de estilos e culturas que exemplificam a diversidade cultural. A moda é para ser democrática e alcançar a todos, sem distinções de corpos, etnias e etc. Posso citar várias pessoas pretas, entre famosos e anônimos que eu conheço que tem uma elegância pura e natural, mesmo quando estão de chinelo e sem maquiagem. Você consegue pensar em alguém assim? Tenho certeza que sim!!

Só pra exemplificar a falta de estudo e conhecimento dessas influencers, vamos falar sobre o poliéster. Em um determinado momento se fez necessário desenvolver materiais como o poliéster, pois do ponto de vista econômico para o consumidor final, ele sai mais barato em relação à fibra natural. Proporcionando que pessoas de baixa renda (que diga-se de passagem, em maioria são pretos e há números estatísticos para comprovar isso!) possam adquirir produtos do vestuário com preços justos e acessíveis, além de que, são mais resistentes à abrasão, por isso possuem alta durabilidade, secagem rápida e são altamente versáteis, ao ponto de poder ser misturados com fibras naturais, como o algodão.

Em outro exemplo, o jeans, assim como o poliéster foi desenvolvido para ter as mesmas características de durabilidade e resistência à abrasão. Para esclarecimentos técnicos, o jeans é originalmente o nome da peça, não do tecido. Na França de 1873 uma composição de sarja de algodão tingida com a cor azul índigo recebeu o nome de “denim”. Era utilizado para fazer as roupas dos marinheiros, principalmente as calças e que receberam o nome de calças jeans! Bem simples assim! Uma peça histórica que tem muito o que contar sobre cultura e comportamento e que não é de difícil acesso para ninguém, principalmente para as influencers de alto poder aquisitivo e que tem acesso fácil à informação.

Precisamos entender que o ponto aqui não é valor monetário dos artigos de moda, mas sim, o valor histórico e cultural desses itens e que são desenvolvidos por culturas, muitas vezes marginalizadas pela sociedade como por exemplo as bermudas oversized, aquelas bem largas e grandes, típicas do vestuário dos jogadores de basquete que ficou muito difundida entre os músicos e artistas do hip-hop. A peça para os atletas tem a função de liberar os movimentos nas quadras, já para os artistas tem o objetivo de identificar uma cultura e um estilo musical e de vestir. Essa mesma bermuda, já foi objeto de várias coleções de marcas de grifes famosas e foi parar no guarda roupa feminino, recebeu outro nome e completou looks de celebridades. Mas também foi muito criticada e intitulada de brega, cafona, desleixada e inadequada.

Eu avisei que era um assunto polêmico e reflexivo! Poderia passar horas falando sobre isso, trazendo exemplos e contando um pouco da história das roupas, mas quero chegar ao ponto de fazer você, leitora/ leitor refletir sempre que se deparar com esses conteúdos nas suas redes sociais. Eu afirmo que esse tipo de comportamento difundido desta forma pejorativa em plataformas de amplo acesso transformam os conceitos de estilo, moda e elegância em termos preconceituosos e excludentes, uma vez que se pautam em padrões econômicos elevados, nem sempre disponíveis para a maior parcela da população, além de descartar e denigrir os conceitos e vestuários das diferentes culturas.
A moda sempre foi uma ferramenta de expressão de ideias, comportamento e cultura, de identificação pessoal como ser integrante de grupos sociais. Se aceitarmos mais uma vez esse tipo de pensamentos excludentes e taxativos, estaremos anulando tudo o que já construímos como seres humanos que são diferentes entre si por natureza. Proponho que na próxima vez em que se deparar com conteúdos deste tipo, se pergunte primeiramente se aquele assunto realmente faz sentido pra você e se ele se aplica à sua realidade.
Faça uma análise pessoal sobre suas referências de beleza. Dedique mais tempo ao seu autoconhecimento e à cultura à qual você se identifica. Ouse romper padrões ditados por aqueles que não tem a mesma cor da sua pele! E lembre-se: elegância é quem você é e não o que você veste!!