Na biografia escrita por Lilia Schwarcz, a questão do racismo no Brasil pós-abolição é amplamente discutida, destacando a vida e obra do escritor Lima Barreto. Desde sua primeira internação no Hospício Nacional em 1914, quando foi erroneamente identificado como branco, até sua morte em 1922 aos 41 anos, Lima Barreto foi uma figura marcante que desafiou as noções raciais e sociais de sua época.
Nascido em 1881, filho de pais livres e neto pessoas escravizadas, Lima Barreto trouxe em sua escrita uma abordagem autobiográfica, explorando suas próprias experiências e as injustiças enfrentadas por pessoas negras em uma sociedade pós-abolição. Desde sua adolescência, quando foi o único negro em sua turma na Escola Politécnica, até seu trabalho como escritor e funcionário público sustentando a família após a morte dos pais, Lima Barreto confrontou o racismo e a desigualdade social.
Sua obra literária, que inclui romances como “Memórias do Escrivão Isaías Caminha” e “O Triste Fim de Policarpo Quaresma”, bem como crônicas e contos, foi marcada por uma forte crítica social. Ele denunciava não apenas o racismo, mas também atacava a República, a imprensa e os estrangeirismos que permeavam a sociedade brasileira da época.
Um dos temas recorrentes em sua obra foi a urbanização desordenada das cidades brasileiras, antecipando problemas que persistem até hoje. Sua crítica à reforma do centro do Rio de Janeiro, que resultou na expulsão de populações pobres para áreas periféricas, ecoa nas questões de desigualdade e exclusão urbana contemporâneas.
Apesar de sua produção literária prolífica e intensa, Lima Barreto enfrentou dificuldades em sua vida pessoal, incluindo o alcoolismo, que afetou sua saúde e sua reputação como escritor. Sua boemia, ao contrário de ser romantizada como em alguns casos na literatura, foi frequentemente vista como uma falha moral, influenciada pelas percepções racistas da época.
No entanto, o legado de Lima Barreto como um visionário triste persiste. Ele foi um dos primeiros a abordar o racismo no Brasil de forma contundente, e suas análises sobre a sociedade e a política brasileiras ainda ressoam hoje. Sua morte prematura aos 41 anos privou o Brasil de um escritor cujo potencial criativo ainda estava em pleno desenvolvimento, deixando para trás um corpo de trabalho influente que continua a inspirar e provocar reflexões sobre as questões raciais e sociais do país.